Quando eu fui convidado para escrever sobre fotografia e audiovisual para a Geleia Total, durante a reunião com o Noé surgiu a ideia de começar os trabalhos dessa coluna falando sobre “Cipriano”, o filme de Douglas Machado. Passadas quase 3 semanas dessa reunião (me desculpa, Noé, pela demora), pensei em aceitar essa ideia e escrever sobre o filme. Para isso, resolvi que iria rever a película… mas – espera um pouco – quando eu me formei em Artes Visuais na UFPI fiz um TCC sobre esse filme!! Não, não, eu não preciso assistir ao filme novamente, eu vi ele 10 vezes pra fazer esse trabalho, não é possível que eu tenha esquecido dele! Bem, eu não esqueci. Na verdade, lembro muito bem. Mas, não vou falar dessas 10 vezes, vou me “prender” à primeira vez que vi o filme. Da vez que, por volta das 2 horas da manhã, comecei a acompanhar a história do velho Cipriano; de suas 5 visões sobre a própria morte; de seus dois filhos, Bigail e Vicente, que buscavam encontrar um cemitério de frente ao mar para enterrar o corpo do pai. Lembro que muitas coisas me chamaram a atenção na obra de Douglas: a fotografia fria, a trilha sonora experimental (como esquecer as incelenças que permeiam todo o filme?), a visão distorcida que Vicente tinha das coisas que ele via. Mas algo conseguiu prender minha atenção mais do que qualquer outra coisa: a representação da Morte. No filme, a Morte é representada por uma figura andrógina, careca, que usa uma longa saia branca, que tem nas mãos um enorme facão e que dança como se fosse uma cobra pronta para atacar a sua vítima. Aquela criatura assustadora e bela é uma espécie de personificação de um pesadelo, uma espécie de monstro saído do quadro do pintor gótico Bosch. As criaturas de Douglas e o espaço onde se passa o filme fizeram com que eu mergulhasse num sertão onírico e me aproximasse ainda mais da cultura nordestina. A estrutura do filme também foi algo que marcou a minha experiência: a obra é dividida em 5 sonhos nos quais Cipriano prevê a sua morte. Com isso, Douglas faz uma referência a uma importante obra do cinema mundial, o filme “Sonhos”, do diretor Akira Kurosawa, que se baseia em vários sonhos reais do artista para criar o enredo do filme. “Cipriano” é uma obra de extrema importância para o cinema piauiense, nordestino e brasileiro, não só pelo fato de ser o primeiro longa-metragem feito no Piauí, mas, principalmente, pela representação de um retrato diferente do sertão nordestino. Algo que foge do estigma de um sertão pobre, seco e sem vida. O sertão de “Cipriano” se apresentava como ele realmente é para mim: poético.
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