Percepções de uma Fotógrafa sobre sua Exposição no Artes de Março

Em sua exposição no Artes de Março, em 2025, no Teresina Shopping, Ana Cândida Carvalho apresenta um conjunto de fotografias digitais, impressas em canvas, sob moldura do tipo filete, seguindo um ritmo notoriamente apegado à ludicidade.

 

A artista busca construir uma tessitura que interliga a representação conceitual à imagem construída. A composição apreende o conteúdo psíquico, mesmo em vieses calculadamente desconectados. Há na contradição uma certeza: é preciso abocanhar contextos, ainda que o olhar não encontre pilares concretos. Talvez seja um convite para uma experiência sinestésica, pois sua obra sinaliza uma conexão entremeios de sentidos densos, ainda que permita o respiro.

Fala de si, em terceira pessoa, como se dialogasse com um anverso desconhecido, convertido em caleidoscópio arquetípico, multifacetado. Reflete, em sincronia com o onírico, que gosta de andar sob tábuas bem presas ao chão, mas costuma alçar altos voos em pensamento. Quer ser lida, sobretudo, como quem pensa entre suspiros profundos e se encontra entre hiatos.

 

Na infância, costumava percorrer a casa buscando espelhos para antever a si mesma: um eu corporificado que presumisse identidade. Nunca se reconheceu naqueles objetos especulares. Caiu de ombros rente ao pensamento espesso: via-se monstruosa! Achou, por bem, colecionar alcunhas pouco amistosas. Dizia, de si, que parecia um “monstro debaixo da cama”. Ora, mal sabia que a palavra “monstro” designa revelação! Revelava, no fundo, que já não cabia naquele receptáculo identitário: transbordava.

 

Nas fotografias, explora, sobretudo, a fusão entre o lúdico e a aspereza ideativa ou vital, como metáfora libertária. As figuras híbridas, ora repletas de lirismo, ora sinistras em demasia, abalam os contornos da imaginação, propondo um desapego, ou abandono em relação às certezas estéticas.

 

Cria mundos outros, desprendidos da realidade, para capturar quimeras, ou acessar possibilidades de um vir a ser sem firulas, desencantado. Porque o velho encantamento retira mesmo o caráter soberano da percepção sobre a vivência diária, apesar do uso de bonecas se repetir nas composições, provavelmente para diluir o peso das demandas cotidianas, fatalmente excludentes.

 

E se a fotografia é escrita com a luz, a artista ousa se caracterizar como poeta. Retrata um caminho para a inclusão, através de um vislumbre de um porvir mais acessível, em poesia imagética.

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