Respeitável público, hoje tem espetáculo? Tem Sim Senhor! Reflexão em comemoração ao dia universal do palhaço! Sou Luan Rodrigues, jornalista e palhaço, mas, hoje não estou aqui para fazer você sorrir.
Apesar da origem do palhaço ser confundida com a história do circo, ninguém sabe ao certo quando surgiu o primeiro personagem. No entanto, pesquisadores apontam que a origem foi na Idade Média, quando algumas pessoas deveriam ser o bobo da corte e fazer o rei e sua corte rir.
Em linhas gerais, aponta-se que o mais antigo palhaço conhecido foi um pigmeu que fingia ser o presidente da corte do Faraó Dadkeri-Assi da quinta dinastia egípcia. Ele era um tipo de bobo da corte da antiguidade. Essa grande figura foi atravessada por várias fases da nossa história, é responsável por trazer alegria e diversão para as pessoas, e percorrem todas as partes onde se concentra um aglomerado de gente, nas ruas, nos parques, nas escolas, nos hospitais, e no circo, o grande lar do palhaço. Ao longo da história da palhaçaria, muitos altos e baixos ou tabus precisaram ser quebrados sobre a visão das pessoas, pois uma determinada parcela da sociedade criou um imaginário negativo acerca do palhaço por compará-los com seres malignos ou provocadores do medo.
Você que é piauiense ou de qualquer lugar do país ou do mundo falante da língua portuguesa pelo menos uma vez na vida já ouviu a expressão clichê: que palhaçada é essa? Ou, deixa de palhaçada! Dentre outras mais que se fossem usadas no “bom sentido” seriam mais leves, no entanto, são termos adotados e enraizados num tom pejorativo, imersa na brincadeira de mau gosto que prejudica uma das artes milenares e mais bonitas que existe, a palhaçaria.
O Coletivo Geleia Total ouviu os nossos palhaços piauienses donos e donas de voz, vez, fala e protesto, sobre a visão de vivenciar e receber esses ataques a arte do palhaço.
Carlos Vinicius, o Palhaço Sardinha está há 21 anos de palhaçaria , para ele é uma dor associar o termo palhaço ao sentido pejorativo da linguagem.
“Primeiramente, desde quando me entendo como palhaço vejo as pessoas usando o “palhaço” como pejorativo e fico muito triste pq palhaço é fazer o bem, fazer as pessoas felizes e me dói ver usando o “palhaço” com coisas má. Sou palhaço porque amo ver as pessoas felizes sorrindo porque pra fazer o bem são poucos e pra fazer o mal te fazer chorar são muitos. Nas políticas quando roubam usam o nariz como protesto isso se torna pra mim um desrespeito que associa a arte de fazer sorrir com corrupção”, afirma.
Talita do Monte, a palhaça Maria das Galinhas, está há 9 anos na palhaçaria, segundo ela
“Enquanto artistas, estamos sempre que possível, acessando o campo da subjetividade e construindo reflexões sobre nossas vivencias e tudo o que nos cerca. Nesse percurso vamos experimentando novos conhecimentos, contestando velhos hábitos e ressignificando termos pejorativos, homofóbicos, machistas e inclusive termos racistas como a palavra denegrir. Portanto é no fazer artístico, na resistência, inclusive enquanto mulheres palhaças, que vamos firmando nossas bandeiras e discursos”.
Yara Lys, a palhaça Panqueca, está há 5 anos na palhacaria, para Panqueca é uma ofensa, a atribuições de brincadeiras de “mau gosto” com a vivência do palhaço.
“Sempre me sinto ofendida quando vejo usarem o termo referindo-se a algo negativo, sei que usam muitas vezes sem pensar e sem relacionar ao profissional, mas sempre que posso corrijo e peço que pensem antes de usar o termo palhaço pejorativamente. Ou seja, para citar fatos negativos que a sociedade julga que está fazendo uma “crítica” de algo e acaba de certa forma denegrindo a palhaçaria? Denigre porque reforça um pensamento coletivo de que palhaço é alguém que simplesmente tem o dom de fazer rir e não sabem que temos formação, treino, estudo, dedicação para entregar um bom trabalho e principalmente que é um trabalho profissional que demanda remuneração”, afirma.
Janny Silva, a palhaça Panela, está há 3 anos na palhaçaria, Panela destaca que a educação sob o uso inaqueado dos termos sobre o palhaço é um processo longo, complicado, mas, não impossível.
“O palhaço, em si, ele é o seu eu brincalhão, o seu eu que leva alegria, o seu eu mais extrovertido, que é o que você era quando criança, por exemplo, você não tinha essa construção de que o ser humano tem que ser comportado, que o ser humano é isso, que o ser humano é aquilo, que ele não pode brincar. Não. O palhaço ele te dá a liberdade de ser quem você é, é… brincando, até as partes ruins da vida, o palhaço transforma em alegria, ele vai rir do próprio mal que acontece com ele. E as pessoas ao ligarem o palhaço a um personagem, que não é um personagem, elas criaram isso na cabeça delas diante de filmes que foram criados nos Estados Unidos, por aí afora, de que existe um palhaço assassino. Ah… tem um assassino no filme… vamos botar um palhaço… e as pessoas já criaram isso na cabeça delas… e ficou estereotipado. Esse termo pejorativo que utilizam… Ah, a câmara é uma palhaçada. Ah, o fulano é um palhaço… Ah, eu sou uma palhaça porque acreditei nas mentiras dele. Isso daí… já foi construído para o ser humano. Para desconstruir isso… é um processo longo, para você fazer as pessoas entenderem que o palhaço é uma profissão… e muito bonita e que tem que ser estudada a fundo é muito complicado. Mas eu acho que o nosso papel também, como palhaço, é fazer as pessoas entenderem isso”, disse.
Lucas Nunes, o palhaço Cuscuz, está há 10 anos na palhaçaria, para ele, o palhaço é símbolo de resistência e superação.
“A arte da palhaçaria e do circo é uma arte milenar, então a gente deve muito respeito. Eu como palhaço é um instrumento sagrado. Ser palhaço, porque eu vou… é a menor máscara do mundo, onde me aproxima das pessoas, onde leva alegria, leva emoção, onde reconecta as pessoas, a sua criança interior. Então quando você compara o palhaço a um termo negativo, está indo de encontro ao conceito do que é o palhaço. O palhaço é aquele que em cena tem a capacidade de escorregar numa casca de banana, cair no chão, mas ele não permanece no chão, ele dá a volta por cima e continua a brincar no picadeiro. Isso mostrando pra gente que o palhaço é um ser humano que supera as dificuldades, ele tem um novo olhar sobre toda a dificuldade que é apresentada pra ele em cena, ou seja, somos nós somos os seres humanos na vida temos dificuldades, mas, temos que ter essa superação, disse.
Cuscuz protesta ao dizer que não faz sentido fracassar o palhaço.
“Então o palhaço ele é uma superação, é uma esperança de dias melhores para a gente olhar para o problema sorrir dele e sacudir a poeira e dar a volta por cima, então não faz sentido o palhaço ser comparado a um fracassado quando você é derrotado em alguma situação e alguém te compara a um palhaço não faz sentido, eu sou totalmente contra e é preciso que haja essa explicação é preciso também que haja é essa abertura para as pessoas entenderem o que é o palhaço e terem esse respeito, uma vez que muitos termos pejorativos são culturalmente mas sem questionar a derivação a gente só replica, replica, mas, não se questiona. Então, eu acho que por meio de palestras, por meio de cursos a gente tem que nós palhaços, nós artistas temos que levantar essa bandeira e temos que ser os primeiros a respeitar a arte da palhaçaria certo? Então viva o palhaço, o palhaço tem que ser respeitado e passado de geração em geração como uma arte, como uma cultura”, finaliza.
Suzy Alves a palhaça Maria do Mel e Carnaúba, está há 7 anos na palhaçaria, para ela,
“Sempre foi uma grande ofensa mesmo antes de ser palhaça, pois venho do Circo social desde criança e esse termo pejorativo sempre me incomodou, venho desconstruindo esse uso errado já tem um tempo, dentro de casa ( família) entre amigos, vizinhança e por onde passo que ouço o uso do termo de forma pejorativa eu questiono e tento desconstruir, pois, sabemos que infelizmente não é tão fácil assim até porque é estrutural e “naturalizado” porém precisamos juntas e juntos desconstruir, pois palhaç(a) é alegria, festa, bom presságio e muita disciplina”, destaca.
Todas as manifestações vivenciadas nesse texto, são de desabafo e liberdade, externar as dores e um outro lado por trás do palhaço, que tanto faz rir, constrói um sentimento de reeducação, preservação de uma das figuras mais leves que existe em nossa arte e cultura. Precisamos refletir os tipos de termos que saem de nossas bocas, precisamos sonhar, aliviar, eternizar os nossos palhaços como algo desprovido de nossas indignações. Precisamos de mais empatia e respeito para um ser que enxerga a fundo o nosso lado humano, pois a arte da palhaçaria é lindo de se ter como uma boa experiência o tempo todo por perto. Por fim, viva o circo! Viva o Respeito! Viva o PALHAÇO!