Revisão de Paulo Narley
Eu li o texto do João, A casa falou comigo, e vi a movimentação sobre o Equipamento Cultural do Trilhos e também sobre o abandono do centro de Teresina e fiquei pensando…
Quando penso em Teresina, penso numa cidade plural, não consigo ver Teresina nos Shoppings, embora insistam para a gente que aquilo é lazer. Tudo bem, existem tentativas hercúleas de levar arte e pensamento para esses espaços, mas eu gosto de pensar que eu queria uma cidade onde eu pudesse levar os turistas sem precisar ter que explicar porque ao lado daquele apêndice histórico tem a porra de um estacionamento ou uma igreja ou uma farmácia ou um bar.
O Centro que me acolhia quando eu era adolescente e andava até a lanchonete do Seu Abraão era outro Centro, era um Centro em que eu passava pela praça Landri Sales e via um espetáculo de teatro descendo de rapel pelo teto do Colégio Liceu Piauiense e todos saiam acompanhando aquele acontecimento até o Mercado Central, onde um Dom Quixote brigava com um Sancho Pancha que saia da feira com seu carrinho confundido com um dragão pelo personagem.
Muitas intervenção pela cidade marcaram esses dias, esses anos, com coletivos guiados pelo Evelin, ou o Balé da Cidade rompendo a multidão, ou mesmo o Xicão com o grupo de rua tirando gargalhadas do povo, lá pelas janelas do Theatro a leitura do Carlos Anchieta ou mesmo a estátua da Silmara Silva provocando comoção. Tinhamos intervenções na cidade!
Era festival de dança durante o dia inteiro praticamente, um festival de bonecos com o Giramundo extraindo suspiros da multidão na Pedro II e ali na mesma praça a atriz Teuda Bara com o grupo Galpão deixando todos sem base com a interpretação de tirar o fôlego
São muitas lembranças e não queria ser um velho de lembranças, queria ir lá e mostrar que “esse é nosso Theatro 4 de Setembro” para as gerações que ainda virão, para os curiosos que nunca pisaram no Centro achando que a arte, cultura e entretenimento só existem no espaço circunscrito da Zona Leste.
Não, meu amor, no Dirceu também tem arte, na Pedra Mole tem até o festival CotJoc, tem hip hop no Parque Piauí, no Poti Velho, Usina Santana, o Centro não resume a arte nem as manifestações que estão vivas e pulsando nos oitenta “cantos” da cidade, mas não é por isso que vou deixar de defender a nossa história.
Ah, a Casa do Barão, O Museu Paulo Libório, A praça Da Costa e Silva, etc… Nem me atrevo a relembrar tudo que vivenciei nesses lugares…
Imaginem aí, se perdemos o nosso Centro Histórico, o que garante a sobrevivência das adjacências das nossas manifestações culturais? Quando temos um povo acostumado a ir das suas escolas particulares para os shopping e para a Europa não temos vínculo algum com esses detalhes importantes para mostrar quem somos.
Quem vai lembrar do Boca da Noite lotado com o Show do Alma Roots cantando em uníssono ou todo mundo se esgoelando ao som da Plaina Maravalha de Validuaté por também ser fissurados nas peças de Tchekhov? Isso são memórias que fazem lembrar de um Centro pulsante onde eu percorria as ruas com meus amigos indo de um lugar a outro em busca de mais uma dose de arte, sempre a arte, entende?
Pode ter objetividade, alimento, tudo, mas é o espírito avassalador da arte, cultura, patrimônio e da história que sai nutrindo as veias de uma cidade afinal “…A gente não quer só comida/ A gente quer comida, diversão e arte/ A gente não quer só comida/ A gente quer saída para qualquer parte…”
Não basta socar cursos profissionalizantes em todos os prédios se no final as almas clamarão pelo ar que movimenta todos os corpos.
Eu já fui a shows, vi muitas peças de teatro no Espaço Trilhos, por isso, por todas essas memórias e por tantas outras coisas temo a extinção de espaços culturais. Queremos espaços culturais e mais equipamentos culturais coletivos, onde todos possam usufruir, acessar e apresentar as suas construções, as suas artes sem censura, sem limitação, com liberdade para criação.