Eu costumo tecer teorias. Gosto disso, sou também uma pesquisadora, é isso o que faço: teorias. Hoje iniciarei apresentando mais uma delas.
Em qualquer pesquisa em plataformas de vídeo é possível encontrar com facilidade gravações de extrações de cravos, espinhas, espículas, esporões de calcâneo, furúnculos e toda sorte do que algumas pessoas chamam de nojeira. Preciso admitir, eu sou uma das milhões de espectadoras desses vídeos. Há períodos em que os assisto com mais frequência que em outros.
Em uma das especulações que faço sobre as coisas do mundo do lado de dentro da gente, me perguntei por que as pessoas gostam tanto desse tipo de publicação. Encontrei explicações científicas sobre a liberação de dopamina no organismo, que justificam o bem-estar que eles provocam, por isso são chamados de “vídeos satisfatórios”. Contudo, essa explicação não foi suficiente para mim. Nas buscas encontrei até gente preocupada com esse “vício” (que exagero). Os psiquiatras que responderam às questões acalmaram essas almas preocupadas dizendo que não tem problema, ver esse tipo de conteúdo não causa nenhum tipo de adoecimento. Não pude não rir. Fiquei pensando que patologia mesmo é ver doença em tudo, até em filmes de extração de espinhas.
Depois de muito pesquisar e permanecer insatisfeita, decidi eu mesma criar uma explicação, uma boa explicação. Eu a chamo de cura através das imagens – “das” imagens mesmo, não “de” imagens”, porque me refiro a tipos específicos de veiculação. Entendo que a tal liberação da dopamina acontece porque, ao ver o pus sendo expelido, as espículas sendo arrancadas, os esporos sendo tirados, o nosso cérebro relaciona ao que temos de doloroso dentro da gente.
Todo mundo tem alguma mágoa. Aquela má água que fica lá parada dentro do nosso coração. Já experimentaram sentir o odor de água sem movimento? Tem cheiro de podre. É isso que a mágoa faz com a gente: nos apodrece por dentro. É como um canto de unha que cresce no lugar errado e por lá fica imóvel, machucando, doendo, supurando. Chega ao ponto de ser necessária intervenção profissional. Uma pena não existirem intervenções médicas únicas e definitivas para tirar as nossas espículas existenciais, os nossos cravos emocionais, os nossos furúnculos espirituais. O mais próximo disso são os psicólogos, terapeutas, psicanalistas e adjacências. A ferramenta deles para auxiliar na cura é a palavra. Eles não usam alicates e nem bisturis, dessa forma o processo é lento.
Esse é um fato que fortalece o meu argumento: quando assistimos a um podólogo arrancar um bicho de pé de um paciente que grita de dor, o que vemos em seguida é um alívio que atinge a nós também. O som de gratidão que escapa às telas nos aquece e nos enche de alegria. Segundo eu mesma e as minhas ideias, o nosso cérebro associa aquela mazela ao nosso sofrimento íntimo e a gente se alivia um pouquinho mais a cada vídeo.
Quisera eu poder arrancar à foice o que me faz sangrar, latejar e supurar o espírito. Se me fosse possível, eu o faria em frente a uma câmera e ofereceria ao mundo como um alento.
Tem alguma história para partilhar comigo? Eu vou adorar saber. Sobre qualquer assunto, os felizes e tristes, de famílias, amantes, amigos, festas, morte, paixão ou doença. Tudo vale. Posso garantir uma escuta atenta e forte.
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