Por que escrevemos?

O ser humano é um animal narrativo, nós contamos histórias, é o que fazemos desde priscas eras. Muitos povos são de tradição oral, culturas inteiras foram repassadas pela fala, apenas contando histórias. Assim nasceram os mitos, os folclores, os contos populares, os arquétipos. É também por isso que gostamos de ouvir mentiras. Surpreso?

Quem não gosta de assistir a um bom filme ou ouvir um causo misterioso?

O fato é que narramos, e o fazemos com o que vemos, ouvimos, experienciamos. E se nada de interessante estiver disponível, a gente inventa, por isso somos, antes de mais nada, grandes mentirosos. Os escritores são apenas pessoas que exercitam mais essa prática milenar, que é mentir. Tal qual uma academia, só que para o cérebro, para aquela parte responsável pela criatividade.

Ariano Suassuna, em uma entrevista, disse que gosta do mentiroso que mente por amor à arte, e não daquele que o faz para prejudicar aos outros. Roberto Bolaños afirmou que todo artista, no fundo, é subversivo, mentiroso. Fernando Pessoa eternizou que o poeta finge o tempo inteiro. Quem sou eu para discordar? Eu que me pego mentindo o tempo inteiro. Minto que estou bem, que o dia está agradável, que as coisas estão melhores agora, que minhas lembranças são sempre boas. Eu minto. Pensando bem, ao afirmar que minto, continuo sendo uma fingida ou a honestidade me bate à porta?

Porque somos seres de referências, lembrei de uma matéria que li outro dia, sobre uma escritora que perdeu algumas relações ao escrever sobre elas. Ela não conseguia se segurar. O marido vivia reclamando, pedindo que ela não colocasse nas crônicas da semana o problema que eles tiveram no dia anterior. Sem jeito. Um artista é um artista. O casamento acabou, mas as crônicas não – ainda bem.

A mãe era a mesma coisa, reclamava sempre. Os amigos, os crushs, só os verdadeiros permaneceram. É porque a arte é feita de verdades. As verdades clandestinas que são contadas com mentiras abertas. Ficou confuso, né? Eu sei. Esse também é o meu papel enquanto artista: problematizar.

Eu já passei pela situação narrada acima. Por outro lado, posso garantir que quando algo me toca e quero narrar, eu o faço enfeitando, porque é assim que a coisa funciona. Vejam, eu sou escritora, não documentarista. Eu não distorço fatos, eu conto mentiras mesmo. Eu pego um fragmento factual e transformo em tramas complexas. Esse é o grande barato da arte, apresentar outros mundos, novos elementos, tocar em feridas, fazer rir, despertar sensações.

Há quem tenha medo da caneta do escritor, eu tenho medo de uma vida sem histórias.

Tem alguma história para partilhar comigo? Eu vou adorar saber. Sobre qualquer assunto, os felizes e tristes, de famílias, amantes, amigos, festas, morte, paixão ou doença. Tudo vale. Posso garantir uma escuta atenta e forte.

E-maildeniseverasletras@gmail.com

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Imagem: de utilização gratuita. Disponível em: https://www.pexels.com/pt-br/foto/margarida-flores-maquina-de-escrever-vintage-17233344/

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  1. “Verdades clandestinas que são contadas com mentiras abertas” foi o seu “bull’s eye”, com toda certeza. Eu troquei “com” por “como”, na primeira leitura, mas compreendo como você expôs e fica muito mais claro. Realmente, nossa arte é mentir descaradamente e verdadeiramente. Mundos se criam, situações, cenas, reflexões e confissões. Tudo como apenas frases no papel. Verdadeiras mentiras para ler, por mais fundo na carne que penetrem ou de onde são arrancadas. Bravíssimo!

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