Para Heitor França, Vívian Moraes e Cecília Machado.
Na semana em que escrevo este texto, eu tive dois encontros com a morte. Um bebê e uma idosa, dois extremos, duas vidas, rotas distintas, o mesmo fim.
Me pergunto o quão feio é sentir raiva de um falecido.
As pessoas costumam dizer que devemos amar, festejar, celebrar em vida. Mas, o que fazer quando o ser com quem você quer partilhar, brindar, brincar, não quer receber você? Quando ele não te atende nem te responde?
Não sei ao certo quantas vezes escutei coisas como “Eu não insisto”, “Não adulo”, “A gente só deve gostar de quem gosta da gente”, e mais algumas variáveis. Ocorre que não é assim que as coisas são, e por isso sinto raiva.
Quando, há três anos, um dos meus melhores amigos se suicidou, eu tive tanta raiva dele que achei que fosse explodir. Ele me afastou. Já em seu último degrau do fundo do poço, ele não respondia, não atendia, ele escolheu se esconder.
Durante um ano inteiro tentei lidar com a confusão que se formou na minha já surtada mente. Através do processo terapêutico, entendi que precisamos de ritos, o velório faz parte do processo.
As mortes simbólicas também são assim. Dia desses li em alguma rede social que não precisamos de conversas para fechar ciclos, que a relação se encerra no momento em que ocorre o desrespeito. Eu quis acreditar, mas não consegui. Creio que tudo que é importante para gente se desfaz aos poucos, por isso os rituais são necessários, e a conversa é um ritual.
A outra coisa em que acredito é nas minhas emoções, em como me sinto, independente de quem esteja do lado de lá.
Cada pessoa tem sua forma particular de viver e elaborar o luto, e não cabe aos outros destituir a legitimidade do sentimento das outras pessoas.
Não sou o tipo que lida bem com a morte – seja ela física ou simbólica – pelo contrário, meus lutos são demorados, doídos, quase palpáveis.
Sou o tipo que detesta ouvir frases como “Veja o sorriso dela, está em paz”. Sempre penso que o semblante do finado é obra do maquiador da funerária, e dificilmente saberemos se aquela pessoa está de fato em paz.
Eu estou de luto sim. Por pessoas queridas que se foram, por uma amiga/irmã – um dos afetos mais antigos que carrego no peito – que perdeu o filho caçula cedo demais, por relações antigas que acabaram, por ciclos que se encerraram de forma torpe, por estar entalada de tanta dor.
Aqui não quero problematizar questões religiosas, nem recriminar quem lida com as suas perdas melhor que eu. Talvez eu seja vaidosa demais, uma má perdedora, ou talvez eu seja apenas um espírito doído, um coração latejante que clama por um pouco de calmaria.
Teresina, 16/09/2023
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Ilustração: “Mãos, Amor, Rose flower”. Disponível para uso gratuito em: https://pixabay.com/pt/photos/m%C3%A3os-amor-rosa-junto-casal-5219048/