Símbolo de luta e resistência, Esperança Garcia foi reconhecida nesta sexta-feira (25) pela Ordem dos Advogados do Brasil como a primeira advogada do Brasil. O CFOAB aprovou também a construção do busto da advogada no átrio do prédio sede. Garcia já tinha sido reconhecida em nível estadual pela OAB-PI em 2017.
Esperança Garcia foi uma mulher escravizada qu viveu no Piauí, acredita-se que ela nasceu em 1751, ela pertencia aos padres jesuítas, que ao serem expulsos do Brasil pelo Marquês de Pombal, foi entregue ao governo do Estado e levada à Fazenda de Algodões, na região de Oeiras, aproximadamente a 300km de Teresina, onde hoje fica localizado o município de Nazaré do Piauí. Ganhou o título de primeira advogada do Piauí concedido pela OAB-PI, devido a coragem e obstinação, denunciando os excessos e maus tratos cometidos pelo feitor da fazenda. A carta escrita pela escrava endereçada ao governador do Piauí, Gonçalo Lourenço Botelho de Castro, é considerada uma das cartas mais antigas do Brasil e desafiadora, escrita e assinada pela mão de uma escravizada no final do Século XVIII.
Carta
“Eu sou hua escrava de V. Sa. administração de Capam. Antº Vieira de Couto, cazada. Desde que o Capam. lá foi adeministrar, q. me tirou da fazenda dos algodois, aonde vevia com meu marido, para ser cozinheira de sua caza, onde nella passo mto mal. A primeira hé q. ha grandes trovoadas de pancadas em hum filho nem sendo uhã criança q. lhe fez estrair sangue pella boca, em mim não poço esplicar q. sou hu colcham de pancadas, tanto q. cahy huã vez do sobrado abaccho peiada, por mezericordia de Ds. esCapei. A segunda estou eu e mais minhas parceiras por confeçar a tres annos. E huã criança minha e duas mais por batizar. Pello q. Peço a V.Sª. pello amor de Ds. e do seu Valimto. ponha aos olhos em mim ordinando digo mandar a Procurador que mande p. a fazda. aonde elle me tirou pa eu viver com meu marido e batizar minha filha q.
De V.Sa. sua escrava Esperança Garcia”
Carta com léxico atualizado
“Eu sou uma escrava de V.Sª. administração de Capitão Antonio Vieira de Couto, casada. Desde que o Capitão lá foi administrar, que me tirou da Fazenda dos Algodões, onde vivia com meu marido, para ser cozinheira de sua casa, onde nela passo tão mal. A primeira é que há grandes trovoadas de pancadas em um filho nem, sendo uma criança que lhe fez extrair sangue pela boca; em mim não posso explicar que sou um colchão de pancadas, tanto que caí uma vez do sobrado abaixo, peada, por misericórdia de Deus escapei. A segunda estou eu e mais minhas parceiras por confessar a três anos. E uma criança minha e duas mais por batizar. Pelo que peço a V.Sª. pelo amor de Deus e do seu valimento, ponha aos olhos em mim, ordenando ao Procurador que mande para a fazenda onde ele me tirou para eu viver com meu marido e batizar minha filha.
De V.Sª. sua escrava, Esperança Garcia”