Revisão: Joana Tainá
Eu apitei o meu apito,
a rapaziada chegou para balancear (bis)
assim chegou o meu povo a todo vapor
é no balanço que eu venho,
é no balanço que eu vou (bis)
Toada do Boi Touro da Ilha
Prepara os pandeiros, o tambor-onça e as maracás, porque a festa vai começar. Conversamos com alguns grupos de Bumba meu boi para elaborar esse texto, então, desde já deixo o nosso muito obrigado ao Marcos do grupo Touro da Ilha (Nova Brasília Teresina-PI), Alexandre do Chacumboi (Matadouro – Teresina-PI), Luan Cássio do Brilho da Noite (Parque União – Timon-MA), Jenilson do Capricho da Ilha (Angelim – Teresina-PI), Gelson Catatau do Novo Fazendinha (Parnaíba-PI) e ao Mestre banja do Estrela da Noite (Vila Santa Cruz, nas adjacências do Promorar – Teresina-PI).
Seja participando de festivais, programas de TV ou com apresentações no terreiro de casa, cada grupo mantém viva uma das maiores manifestações populares do Nordeste. Mas, se engana quem pensa que é só brincadeira, na verdade, o trabalho não é pouco e nem se resume ao período das Festas Juninas, ele dura o ano todo com a confecção de trajes e dos instrumentos, feitura do boi, das toadas e ensaios.
E como faz para custear isso tudo? O jeito é realizar bingos, churrascos arrecadar dinheiro do jeito que der, uma vez que só com o incentivo financeiro do governo não é o bastante para manter um boi dançando ano após ano¹. Infelizmente, alguns grupos acabam por encerrar as atividades, sendo obrigadas a deixar as apresentações sob um hiato, como é o caso do Novo Fazendinha que desde 2017 não brinca de boi.
Como os grupos de Bumba meu boi estão atravessando a pandemia?
Touro da Ilha: Estamos somente fazendo lives nas redes sociais e também preparando nossas fantasias na sede do boi.
Brilho da Noite: Participamos de lives, e agora no mês de junho o grupo foi para o arraial da vacina em Timon, que por conta da pandemia, só pudemos levar pouquíssimas pessoas para as apresentações.
Capricho da Ilha: Pra não parar e não se acabar a cultura estamos fazendo lives com o uso de máscara e dentro do limite que se pede só porque amamos a brincadeira.
Estrela da Noite: No começo da pandemia, a gente suspendeu os ensaios, mas continuamos os trabalhos de figurino e bordados, acreditando que em junho de 2020 o vírus já teria indo embora. Então, o nosso coração foi se entristecendo quando vimos o mês de junho chegar e a situação da pandemia só piorando. Aí a gente suspendeu até os bordados, o desânimo bateu. Mas, uma coisa boa veio amenizar a situação: recebemos recursos através da lei de emergência cultural Aldir Blanc e do Edital Maria da Inglaterra, executado pela SECULT. Com eles pudemos continuar com o trabalho das bordadeiras, das costureiras, dos puxadores de pandeiros, do nosso alegorista. Pela primeira vez pudemos pagar um valor justo ao nosso povo.
Chacumboi: O grupo estava parado, mas agora estamos todos trabalhando para as lives.
Quais os maiores desafios para manter viva a tradição (fora a pandemia)?
Touro da Ilha: Essa é uma cultura muito especial para nós. Tiramos muitos jovens e adultos desse mundo complicado em que estamos vivendo. Um dos maiores desafios mesmo é o de manter sempre nossos trabalhos para não acabar a tradição.
Brilho da Noite: Não temos um local próprio para os ensaios. E os órgãos não valorizam a cultura, aí fica difícil de colocar a cultura de pé. Se o dono da brincadeira não tiver sangue no olho, tenho certeza que vai se acabar!
Capricho da Ilha: Bumba meu boi pra gente é uma tradição de família que vem repassando de pai pra filho, e uma brincadeira boa porque incentiva as crianças a saírem das ruas. Os nossos desafios são o de alcançar mais as crianças e conseguir recursos pra mantermos a brincadeira do Bumba boi. Também não temos um local de ensaio próprio, estamos ensaiando com as crianças na rua mesmo.
Novo Fazendinha: Com essa última gestão municipal cortaram os prêmios do São João da Parnaíba diminuindo o valor consideravelmente, que não dá nem pra fazer as vestimentas, virou mais um prêmio simbólico. Então, existe toda uma luta, uma resistência para continuar fazendo essa tradição. É basicamente a família inteira do amo João Rodrigues (mestre de cerimônia do Bumba meu boi; hoje com 85 anos) que vai e busca, faz rifa para conseguir recurso.
Estrela da Noite: Primeiramente, destacamos a falta de atenção das autoridades públicas. Muitas tentativas de diálogos nos setores culturais públicos foram frustradas devido a grande “chá de cadeira” e a pouco tempo para apresentarmos nossas necessidades. Infelizmente, sentimos um certo “preconceito” da parte das autoridades, porque o boi do Piauí é um boi de periferia, das Vilas, das ruas da nossa cidade, então é como se a gente não tivesse voz. Confesso também que a modernidade veio tão rápido, e só agora é que estamos nos adaptando, vendo a necessidade de ir para as redes sociais, de aperfeiçoar o nosso povo, de aprender a fazer projeto cultural e de registrar o grupo com CNPJ.
Chacumboi: O grupo foi fundado em 2010 com objetivo de desenvolver um trabalho social com as crianças do bairro ensinando a cultura popular do Bumba meu boi e de suas tradições, com dança, canto e ritmo. Um dos desafios é manter os brincantes no grupo.
Alô, rapaziada, Chacumboi chegou (x2)
pra brincar ele vem lá do curral
o Matadouro é o quintal
da cultura popular do Bumba meu Boi
Toada do boi Chacumboi
Cada grupo tem sua maneira única de se apresentar. Não são todos que encenam a história da Catirina e do pai Francisco, mas, no geral, eles compartilham de desafios semelhantes. Se hoje um boi dança é em decorrência de uma luta de longa data e que envolve (ou deveria envolver) toda a comunidade a qual pertence.
Se quiser ler mais sobre o Bumba meu boi, temos um texto falando sobre mãe Catirina e pai Francisco aqui.
Referências
¹ Imperador da Ilha: a prática folkcomunicacional no Bumba meu boi do Piauí. Texto de Elaine de Moura Lima e Susana Silva, orientação de Cláudio Vasconcelos (Pode ser lido aqui)
Breve história e etnografia do grupo Novo Fazendinha: o São João Da Parnaíba (PI), seus artistas e bois rivais. Artigo de Weslley Fontenele Frota (Pode ser lido aqui)
Acabou-se a brincadeira? O Teatro do boi e a estrela da gente boieira na mira do Lagoas do Norte. Texto de Lucas Coelho Pereira. (Pode ser lido aqui)
G1 – Grupo Capricho da Ilha se apresenta para manter vivo o Bumba Meu Boi (Pode ser lido aqui)
G1 – Grupo mantém tradição de dançar bumba meu boi há 80 anos no Piauí (Pode ser lido aqui)