Elus não querem voltar atrás
No dia 29 de janeiro, é comemorado o Dia Nacional da Visibilidade Trans. A data foi escolhida porque nela houve o lançamento oficial da campanha “Travesti e Respeito”, promovida pelo Programa Nacional de DST/Aids, do Ministério da Saúde, em 2004, e que se tornou um marco para a luta protagonizada por militantes travestis históricas, como Fernanda Benvenutty, Jovana Baby, Kátia Tapety, Keila Simpson, entre muitas outras que deram a sua vida em busca de uma sociedade mais humanitária.
O termo trans é uma abreviação de “transgêneros e transexual”, uma referência às pessoas que não se identificam com o gênero que lhes foi atribuído quando nasceram. Nos últimos anos, houve um avanço para a visibilidade e o reconhecimento do direito à existência das pessoas trans enquanto cidadãs, mas ainda não há acesso pleno a direitos fundamentais como o de identidade, direito ao autorreconhecimento, direito de ir e vir, direito à vida.
A visibilidade representa a luta incansável pelo direito de ser feliz. Em uma conversa com nossos redatores e uma seguidora da geleia, a artista e estudante de Psicologia Zayze Medeiros, a poeta, escritora e Drag Queen Ayra Dias, que é natural de São Caetano de Odilevas-PA, mas radicada em Teresina há alguns anos, o advogado Miguel Cardoso e a estudante de Educação Física, Luyza Afrodyte, formulamos sentimentos de maturidade e protesto quanto às vivências elencadas no “mundo Trans”.
A ocupação de Espaço na Mídia
A mídia atrai, incomoda, causa, grita, hoje, principalmente as redes sociais provocam guerra e como uma corrente de aprendizados aproxima a possíveis soluções. “Acho importante que ocupemos espaço nas mídias que exterminem a piada e o escárnio que durante tantos anos foram nosso ‘palco’ e local de ‘visibilidade’, mais reforçando a transfobia do que qualquer outra coisa. Queremos ocupar as mídias tanto quanto qualquer pessoa cisgênero, queremos falar sobre assuntos sérios e ser olvides, queremos cantar, atuar, rir, chorar”, comentou Zayze Medeiros
“A Geleia Total é um espaço bastante diverso e plural, e por isso confio no trabalho que estamos exercendo agora, onde pretendemos divulgar e enaltecer a arte produzida diretamente por corpos trans e travestis, além da importância política de sobrevivência na inclusão das nossas histórias e do nosso protagonismo. Ao longo do mês, conheceremos pessoas incríveis, até então sem o devido reconhecimento que tanto merecem, e nos esforçaremos para levar essas pessoas adiante, incluindo-as não somente agora, mas em todos os contextos sociais e artísticos que lhes são negados na sociedade masculinista e patriarcal em que vivemos”, acrescentou a artista.
A matéria é escrita, as homenagens são postas sobre a mesa, mas a violência e o desrespeito contra a comunidade trans acontecem diariamente. “Somos vítimas de um processo de genocídio escancarado. O que vocês estão fazendo para ajudar a acabar com a violência que pessoas Cis cometem contra nós? Ah, isso não é um dedo apontado pra ninguém é um grito de desespero de quem tem um alvo no peito e amanhã pode ser a próxima. Podemos, juntos, pensar em como potencializar trabalhos, pensar em outros, as narrativas são nossas, o espaço é nosso, porém, todos podem ajudar na construção de algo maior, melhor e mais potente”, relata Ayra Dias.
“A mídia é um espaço democrático, público, é um local voltado para a sociedade para o povo para as pessoas e ocupar esses espaços, além de estar exercendo a democracia legítima, é uma forma de dar voz, dar local de fala, uma oportunidade de expressar nossas lutas, nossos anseios, nossas vontades, de dizer ‘nós existimos’, estamos aqui e queremos viver, queremos amar, queremos trabalhar, queremos construir junto a todos , nós queremos equidade , amor , solidariedade, nós queremos ser tratados como cidadãos, ter direitos e poder exercer esses direitos inerentes a todos, queremos mais que tudo poder exercer a igualdade independente de raça, sexo, cor ou sexualidade. Antes de tudo isso, nós somos seres humanos e queremos ser tratados como tal. E a mídia tem essa força, essa capacidade de demonstrar a todos os brasileiros que somos pessoas e merecemos ser pessoas assim como qualquer outro ser humano”, comenta Miguel Cardoso.
“A mídia tá recheada de pessoas trans e travestis abordando o tema. Isso é muito importante porque alcança muita gente, é um alcance global, entendeu? Não é um alcance local, não é um alcance regional, é um alcance global, onde muitos ativistas se pronunciam em relação aos nossos direitos e tudo mais, e querendo ou não a mídia é um canal importantíssimo para a divulgação de que nós existimos, de que nós temos direito, de que nós somos pessoas que, assim como outras, temos necessidade de ser respeitados, de ter um trabalho, de ir e vir pra onde quiser, assim como outras pessoas, porque tem gente que acha que, por exemplo, trans e travesti só vive durante a noite, não vive durante o dia, e todo mundo quer uma vida normal, só que é mais difícil, por quê? Por conta da nossa sociedade, de marginalizarem as pessoas, então, é muito importante que a mídia promova voz para nós pessoas trans”, acrescentou Luyza Afrodyte.
A importância do mês da Visibilidade Trans.
Sobre a importância de levantar a bandeira em pedido de paz, vem o reforço para que essa data seja discutida e os direitos conquistados durante o ano inteiro. “O mês da visibilidade trans, coincidentemente, e não por acaso, já se iniciou com o assassinato de uma garota de apenas 13 anos no estado do Ceará. Termos a possibilidade de espaços onde possamos falar e questionar o “cistema” que nos oprime é muito importante, mas não somente durante o mês de janeiro, uma vez que sofremos violência ao longo de anos inteiros, sem descanso, sem piedade ou propagação das mídias que só nos “enxergam” durante este período. Queremos, SIM, realizar campanhas e projetos que visem à discussão de nossas existências, mas a longo prazo”, comentou Zayze Medeiros.
“Acho a data importante para reafirmar nossas existências, mas, como já falei anteriormente, precisamos que a data seja uma reafirmação, porém, que ao longo do ano a gente permaneça em locais de visibilidade e relevância social”, completou.
Ayra Dias reforça que “A transfobia é pensada, estruturada e praticada por pessoas cis, logo, são estas pessoas as principais responsáveis por pensar em possibilidades de desconstruir esse ‘CIStema’ violento que nos faz vítimas. Não é possível que, além de tentar não morrer, ainda tenhamos que pensar sozinhas em todas as soluções”, acrescentou a escritora.
“O mês da visibilidade trans é valoroso. Nessa data, podemos mostrar que existimos e reexistimos; na verdade, estamos nessa luta o ano todo, a vida toda, mas nessa data em específico a sociedade de certa forma se volta aos nossos olhares, mesmo que em pequena parcela, mas é interessante evoluir mesmo que sejam pequenos passos, mas que avancemos caminhando rumo ao caminho sem preconceito, com mais amor ao próximo, mais respeito e equidade. É significativo, também, pois é um momento nosso, onde podemos nos prestigiar, nos empoderar, dar local de fala para a nossa classe tão pouco ouvida, mês de experienciar colegas artistas trans, profissionais trans, pessoas trans, compartilhar vivências, experiências, lutas, vitórias, um mês de alegria, de sorrisos, mas também de lutas e desafios. Nós somos fortes, existimos e reexistimos e a nossa luta é legítima é importante e não só para nós pessoas trans mas para a evolução de toda a sociedade, uma evolução semeada no amor e na equidade”, comentou Miguel Cardoso
Luyza Afrodyte reforça a importância da discussão para as futuras gerações: “A data é importante porque é uma conquista realizada com muita luta tanto para as meninas trans quanto para os homens trans, pois nesta data um grupo de trans foi ao congresso nacional pedir, pedir não, GRITAR por direitos. Que nós também somos seres humanos, também temos direito, então, essa data, querendo ou não, é muito importante para essa nova geração, porque foi uma conquista, que se teve durante os anos.”
“A programação da Geleia se chama ‘tudo sobre nós e nada sobre eles’, justamente com o intuito de falar mais sobre essas pautas de pessoas transgêneras rompendo um pouco com a lógica que é de produzir material pedagógico e didático a todo tempo para as pessoas cisgêneras, e esquecendo que esse mês é voltado para nós e sobre nós”, finaliza Ayra Dias.
Além desta data simbólica, comemorada no próximo dia 29 de janeiro, precisamos manter em mente o respeito pelas pessoas trans. Durante o mês de programação, a Geleia Total vem trazendo posts, matérias, lives, vídeos, ensaios fotográficos, nos fazendo repensar os nossos papéis nessa construção e acolhendo uma luta que segue resistente para o futuro.