Num-se-pode e pode!
Nascer como vísceras de bicho:
Crescer na margem
Desfilar na lama
Contar os trocados
Ser sertão na favela.
Se pode o reinado dos pretos
Enclausurados pelo estrondo de bala
Sem casa, sem argumento e sem teto.
Pelo corpo caído na rua
Pelo pobre vendendo agulha
Na feira do mercado velho.
Num-se-pode.
Mas acontece!
Se pode a travesti escondida
Com medo, com dor e ferida
Debaixo do lampião.
Se pode a mulher escondida
Tentando ganhar a vida
Se matando para salvar o patrão.
Num-se-pode. E pode!
Se pode o esgoto e a farda
Se pode o circo e pão
Se pode jogar a verdade
Na cara do cidadão.
Num-se-pode, e pode:
Um genocida atuando
À luz do lampião.
Pode?
Anúncio de jogão
Churrasco pro barão
Festinha na zona leste
E para o pobre a prisão.
Num-se-pode!
E pode!
Sertão
Ser tão
miserável e ter retidão?
Num-se-pode, e pode!
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Arte e Poesia: Marcileia Ribeiro (haiasaer)