Eu não posso escrever política, por Alisson Carvalho

Foto: Alisson Carvalho

Os meus lábios ressecaram. Foi a brisa abrasadora, janela do leste, uma fragrância campestre que impregnou o beco com pestis. Costuram desde sempre uma peste e já pintaram procurado noutro Prestes, deixando o brasão maculado da dor. Rubra cicatriz incolor vagueia nas sinapses dos probos. Maniqueístas esquizofrênicos buscando miragens, clivagem, fantasias embrionárias. Tatuaram no feto o destino. Escamas nos olhos por escolha, escolhas, encolha. Formam gigantes diminutos, um mundo. Miríades de músculos condensados no medo. Enlatados, comprimidos, esmagados. Sonhos nas velas, desancorados, libertos, dispersos, perdidos, pulverizados. Suprimidos, emitem emudecidos a ira dos derrotados. Fragmentados e isolados, são fagulhas cintilantes no breu, um céu estrelado. Não precisam de brilho, necessitam da fúria dos revoltados. Implodem universos. Ainda é possível ecoar, afinal o ruído não é um erro se o silêncio imperar. O cinza tintura, o chumbo emerge, o absurdo prevalece. Alerta de perigo: os ímpios são os portadores das chamas! Os Prometeus sempre serão a mácula no pasto onde a ordem é a lei. Portanto, alumiar a mente será o maior dos crimes. O incêndio de ideias ameaça os anciãos, pois tem sempre um arúspice encucando nos pupilos insanos o germe da insurreição: é preciso libertar as correntes doutrinadoras da servidão. Sorve-se a peçonha que tragou Sócrates. O padrão enrijece a dança da empatia. A verdade sempre constrangeu a mais pura criança. Que moral há na cumplicidade? Uma mísera, ingênua e raquítica esperança de mudança camuflada de saudade? O carrasco que carrega a arma da punição é também o que silencia a canção na lama da omissão. Esconder-se na ideia não é fazer revolução.

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