O modelo de educação tradicional foi pensado para as características e necessidades do século XX. Todo o sistema educacional é estruturado para formar funcionários, trabalhadores para exercer funções específicas, bem delimitadas, com tarefas claras a serem cumpridas. Somos educados para decorar, obedecer, aceitar. Enquanto o século XXI precisa de pessoas criativas, capazes de resolver problemas que ainda nem surgiram e que tenham protagonismo.
Infelizmente, nossa educação é bastante voltada para o sucesso no vestibular e em concursos públicos. Foco em conhecimento técnico, instrumental.
“Aqui, a mania dos que ficam é o comércio e as letras: todo mundo quer vender, ninguém quer produzir; todo mundo quer ser doutor, todo mundo tem um filho-águia que deve ser aproveitado. Dentro de dez anos, seu Araújo, não sei aonde iremos parar. Ou teremos de ver bacharéis tocando forjas de ferreiro, batendo sola, desbastando madeira, vendendo lenha, ou, então, é preciso que uma outra raça venha tomar conta das oficinas desertas. Chegaremos ao ideal de uma geração, inteira, de médicos, dentistas, farmacêuticos, parteiros, sem termos quem nos faça um par de sapatos, quem nos prepare as ceroulas. É o exército do proletariado das letras que toma posições a espera do momento de atirar-se aos cofres públicos.” Um Manicaca – Abdias Neves (1909).
Muitas profissões populares, no futuro, nem existirão. A realidade irreversível nas organizações é a necessidade de funcionários que realizem várias atividades ao mesmo tempo, tenham flexibilidade e aprendam com facilidade novas competências, habilidades, conhecimentos. E mais do que isso: o século XXI clama por cidadãos cientes de seus deveres e com visão crítica da sociedade. O cidadão comum está cada vez mais empoderado e atuante no futuro do planeta, logo, sua formação desde criança precisa levar em conta essa responsabilidade.
Nesse cenário, o ensino de arte, sobre arte e com arte não é mais, na minha opinião, uma opção. É obrigação das escolas e de todo o sistema educacional, mas vou focar aqui nas escolas, porque a formação básica é, sem dúvida, a mais importante. Um cidadão com uma boa bagagem, que sabe aprender a aprender, que tem uma visão crítica e madura sobre si e sobre o mundo com certeza saberá trilhar um bom caminho quando adulto.
A arte é essencial para estimular a criatividade. Com tantos problemas que o nosso mundo está passando e passará, precisamos de pessoas com criatividade para resolver grandes dilemas com grandes restrições. Arte é um grande exercício de empatia, entender o que o outro pensa, sente. Também ajuda a entender o que nós mesmos sentimos. Arte nos conecta com os outros, com o mundo. Arte nos humaniza. E se tem algo que precisamos urgentemente é de pessoas mais humanas.
As escolas, além disso, têm papel importantíssimo na formação de plateia para todas as artes. É inacreditável, por exemplo, a quantidade de pessoas que nunca foi ao teatro mesmo tendo idade avançada. E muitas vezes nunca foram ao teatro por desconhecimento. Se nas escolas os alunos entendessem como funcionam todas as artes, com certeza iriam saber apreciá-las ao longo de suas vidas.
Sem falar na responsabilidade enorme que as escolas têm na revelação de grandes artistas. Se os talentos forem descobertos, trabalhados e incentivados desde cedo, com certeza a humanidade poderá conhecer e apreciar a arte de grandes artistas. Mas o que vemos nas escolas infelizmente é o contrário. Esses talentos sendo podados, controlados, sufocados, enquanto há uma supervalorização do ensino de ciências exatas, tanto pelos pais quanto pelas escolas.
E a arte pode ser utilizada como metodologia de ensino, em todas as disciplinas, para ajudar as aulas a serem mais dinâmicas, envolver mais os alunos no processo de aprendizagem, dar cada a eles vez mais protagonismo. É uma maneira de tirar os alunos da posição de ouvintes para colocá-los na posição de criadores de conhecimento.
Escolas que negligenciam a importância da arte para a formação de seus alunos são extremamente irresponsáveis porque não estão preparando cidadãos capazes de lidar com a realidade do século XXI. Precisamos de ensino de arte, sobre arte e com arte.
Por Noé Filho.
A educação mecanizada, digo, tecnocrata, cada vez formando especialistas e sem preparar a pessoa para o mundo real é algo preocupante. Formamos respondedores de questões especializados em bizus, exímios tradutores das linguagens dos diversos certames e bancas avaliadoras, contudo que muitas vezes não refletem criticamente questões que atravessam a humanidade. Especialistas apartados das discussões sociais e políticas são INDIVÍDUOS que, aparentemente, não questionam as regras, são meras ferramentas de trabalho. A educação humanista, com conhecimentos holísticos e multidisciplinar é essencial para formar não apenas indivíduos preocupados com as necessidades imediatas, mas seres com responsabilidade social, mais humanos.
A Arte humaniza, liberta, ensina e nos deixa mais felizes com um posicionamento crítico a respeito das coisas e fatos que nos cercam. Parabéns,Noé Filho. Excelente texto.