“Fiu-fiu”. O assobio e os risos dos homens sentados no bar da esquina não a incomodavam. Noite quente teresinense. Final de semana e a madrugada já se aproximava. Em uma época como aquela em que as mulheres não podiam andar tão tarde, tampouco sozinhas, ela ultrapassava todas essas regras e não se importava com as coisas que “não se pode”. Saia nas horas noturnas que bem quisesse, sem companhia, sem regras. E não só por isso chamava bastante atenção.
O vestido branco e justo a deslizar pelas curvas do corpo farto e alto. O caminhar sensual e desacompanhado. A cor do batom forte. Tudo em si compunha uma imagem misteriosamente chamativa. E gostava de causar essa atração dos olhares, principalmente se forem daqueles homens quentes na noite de Teresina.
Nessas noites, ela seguia em seu desfile encantador até a Praça Saraiva – seu lugar preferido da cidade – e até lá ia arrastando, quase que enfeitiçados, um ou outro homem. Encostava em algum poste de lampião e ficava fitando o fogo a queimar ali no alto. De dentro de si, brotava aquele vício prazeroso que cultuava: uma imensa vontade de fumar. E a chama do lampião era como uma força que a chamava e fazia despertar nela algo maligno que não sabia nomear.
Essa mistura de vício, sensualidade, maldade transbordava dela e despertava ainda mais curiosidade nos homens que a seguiam pela praça Saraiva. A maioria deles não tinham coragem suficiente para chegar perto dela e puxar conversa. Outros poucos, sim. E, para a surpresa desses homens, antes de tentarem uma conversa, ela iniciava logo a pedir:
– Tem um cigarro para me dar, cavalheiro? – uma voz de donzela que ressaltava ainda mais sua beleza estonteante.
Nesse instante, geralmente, o homem ficava sem palavras e passava um cigarro para ela. E diante dessa falta de atitude masculina, algo dentro dela se enchia de deleite, crescia e crescia dentro de si uma energia que não sabia conter, quase como um orgasmo maléfico ou uma força de puro mal e prazer.
A voz de donzela se transformava em uma voz rouca, grave e de dentro das suas profundezas saía a repetir “num se pode, num se pode, num se pode…”. A cada “não se poder” que repetia, a linda mulher ia mostrando sua real forma de assombração, esticando o corpo para o alto, rumo à chama em cima do poste. E ali, acendia o cigarro para satisfazer o prazer maligno do seu vício.
E essa voz gutural a repetir “num se pode” é tudo o que os homens se recordam no outro dia, em que acordam assustados, após uma longa noite quente de pesadelos em Teresina.
Escrito por Evilanne Brandão.
Teoria
Essa mulher poderia ter morrido ou sido morta por alguém nessa Praça Saraíva. Provavelmente aconteceu tarde da noite, quando não se podia ficar andando pelas ruas, e ela poderia estar fumando na ocasião. Ela pode ser um espírito vingativo que ataca os homens pensando que os tais poderia ser seu assassino.