Madalena é o retrato de uma Teresina esquecida, sua voz foi soterrada pelo descaso. Não tem o que dizer, é a nova queimada da “modernidade”. Teresina quer ser “muderna”, abandonar todos os traços do passado que acorrentam o seu avanço desesperado.
O nosso slogan progressista está no peito, na mente e no desejo de cada transeunte apático. Não é mais novidade a tal destruição justificada por toda a fortuna hospitalar conquistada pela “cidade verde”, a “cidade da saúde”, a cidade “muderna”, que esconde e enfraquece a sua própria história.
Madalena despenca lentamente e quando for diagnosticada inválida, a rainha será deposta, condenada a demolição. Queira eu estar enganado, mas o futuro do lugar por ela ocupado será mais uma clínica, farmácia ou, pior, estacionamento do patrão.
Teresina cresceu à contragosto do povo, empurrada goela abaixo. Tornou-se discurso respeitado, apartou o resto e maquiou o sangue queimado. As novas chamas estão disfarçadas, tentam remanejar sempre quem não tem voz. É a “mudernização” do aeroporto ou a ampliação do Lagoas do Norte. Seja o que for, o importante é ter que avançar.
Viva Madalena, que não verá as chamas da “mudernidade” consumindo a sua antiga residência, construída em 1938 na rua Félix Pacheco. Pouco adiantou os gritos estudantis e a vitória diante da violenta demolição. Acontece que tem uma certa parcela, bem pequena mesmo, que não chamarei de burguesia para não estigmatizar ninguém, mas que não se importa de burlar as leis, pois as regras são inaplicáveis para alguns bem-nascidos.
Uma multa aqui outra ali não fará falta. Esse abandono serve para camuflar a má vontade, a má fé e o descaso. É o assassinato da memória. Memória só serve se for compartilhada, se tiver uma relação direta com os vivos e uma função social. A nova fumaça no horizonte não tem chamas, é o indício da demolição. E todos calados observam a nova construção.
“Viva essa Teresina do futuro”
Autor: Alisson Carvalho
Livro: Rascunhos Líquidos (2018)
Bem oportuna essa reflexao.